Tudo começou por um insignificante murmúrio, um pequeno zumbido ruminando na testa. Depois passou para tonturas e por fim o desmaio que culminou na passagem pelo hospital. “Tem pouca glicose, precisa descansar, as tensões muito baixas, análises a isto e àquilo”, tudo misturado com conselhos médicos e olhares para os ponteiros, disfarçados do relógio. Andam no ar, as palavras como roldanas formando perfeitos e científicos mecanismos. Eu muito longe dali, a brincar com a Joana na varanda da minha avó, soprando bolas de sabão ao vento. “Mais açúcar, precisa de mais açúcar para equilibrar o organismo”. Se lhe explicasse o que sentia encolhia os ombros, mesmo assim, abriria o grande livro das doenças e desequilíbrios gerais para nada encontrar. “ Para o seu mal não existe cura, caro amigo”, diria resignado. ”Mas tenho um médico meu amigo que estuda casos assim...”, e pousaria na minha mão um cartão dourado. Obrigado vou indo, já me chega a vizinha do lado, e a gata com cio, largando gemidos do terceiro andar. Já me chega a chuva, a merda da chuva corroendo os passeios encharcando as roupas enegrecendo o coração, sim senhor doutor, a porca da chuva que teima em não amainar por mais que eu dance em círculos. É aqui que volto a Joana, debruçada na varanda, a soprar ao vento grandes e redondos balões de sabão.
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